terça-feira, 14 de julho de 2009

IRREPARÁVEL

A queda de uma criança do 5º andar de um prédio no Rio de Janeiro, deixou em evidência o debate sobre a questão do abandono de incapazes, pois segundo a polícia pai e mãe foram autuados, já que a menina Rita de Cássia, de 5 anos, foi deixada sozinha em casa. Segundo determina o art. 133 do Código penal:

Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono:

Pena — detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos.

§1º Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena: — reclusão, de 1(um) a 5 (cinco) anos.

§ 2º Se resulta a morte:

Pena: — reclusão de 4 (quatro) a 12(doze) anos.

§ 3º As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço:

I — se o abandono ocorre em lugar ermo;

II — se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima.

III — se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos

Os pais deixaram a criança cair por descuido, não tiveram a intenção de matar a filha. Com toda a certeza nenhuma mãe ou pai deixariam de sofrer, e muito, pela perda de seu filho (a não ser aqueles que agissem com dolo, e mesmo assim muitos se arrependem amargamente depois do delito). Trata-se de crime não intencional (culposo), que admite o chamado perdão judicial, ou seja, o juiz analisa o caso, reconhece o crime assim como a culpabilidade do agente, mas em seguida concede o perdão judicial (Código Penal, artigo 121, parágrafo 5º), julgando extinta a punibilidade.

O fundamento principal para a concessão do perdão judicial, nesses casos, é o seguinte: os pais, com suas condutas, já sofreram o suficiente diante da sua própria negligência. Eles experimentam uma espécie de "pena natural". Quando o fato, pelas suas conseqüências, atinge os agentes de forma grave, a pena se torna desnecessária; cabe ao juiz, nessa situação, deixar de aplicá-la. Qualquer sanção estatal seria pura expressão de desumanidade e de desproporcionalidade. Isso significa, na vida real, que o agente sofre uma dupla punição: a primeira decorrente do seu próprio ato (perda de um filho); a segunda consiste na obrigatoriedade de responder a um processo criminal que, por si só, já constitui um sério constrangimento.

Aqui reside um ponto em que o processo penal está totalmente defasado em relação ao direito penal. Se o direito processual penal é instrumental, ou seja, se ele serve (primordialmente) para a aplicação do direito penal, não há dúvida que o Parlamento brasileiro deve atualizar o Código do Processo Penal nesse ponto, para permitir, já no limiar da ação penal, que o juiz, de plano, reconheça o perdão judicial. É excessivo e desproporcional compelir o agente, que já foi punido pelo próprio fato, a se submeter a um longo, penoso, degradante e desnecessário processo criminal.

SIDNEY SIQUEIRA

DOWNLOAD

Quem nunca fez um download na vida que atire a primeira pedra! É, exagerei agora! Mas, é algo tão corriqueiro que me leva a usar tal expressão, e levantar uma questão que ainda mexe com a cabeça de muitos, é ou não é crime fazer download?

Segundo o artigo 184 do Código de Processo Penal “violar direitos de autor e os que lhe são conexos, pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. E se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente, pena de reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”.

Prescrição normativa que evidencia que baixar músicas, filmes ou livros pela internet, para uso doméstico não é crime e nem pirataria, é permitida a cópia integral de obra intelectual, sem autorização do detentor do direito autoral, desde que não se vise lucro, seja direto, seja indireto, mas é proibida a cópia não autorizada, mesmo parcial, para fins lucrativos. O que caracteriza a pirataria é o Lucro obtido ilicitamente, ou seja, não pode baixar “isso ou aquilo” para comercialização, ao passo que se o locador o fizer poderão configurar-se violação de direito autoral e concorrência desleal. É “o intuito de lucro” que configura o crime e não a simples cópia sem autorização expressa do titular do direito. Quem lucra com estes negócios de downloads para vender posteriormente, é que deve ser apelidado de pirata informático.

Ressaltando que não quero aqui afirmar que os autores, gravadoras, editoras não têm o direito de reaver o esforço intelectual e financeiro desprendido para produção da obra e que com tal comportamento não estamos sendo responsáveis diretos/indiretos pela diminuição da arrecadação de impostos e inúmeros outros problemas decorrentes, mas sim demonstrar que pelo Princípio da Reserva Legal, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia fixação legal, a cópia integral não constitui sequer contravenção. Portanto, mais que na hora de uma alteração na redação normativa, possibilitando que o procedimento de uma possível punição seja realizado dentro dos trâmites legais.

Agora, o que não podemos negar são as inúmeras vantagens de livros e revistas digitalizados, como seu baixo custo de produção e armazenamento, a enorme facilidade de consulta que o formato proporciona e seus benefícios ecológicos. O download gratuito de livros virtuais nada mais é que uma nova versão do empréstimo de livros e revistas, de forma mais rápida, econômica e segura, multiplicando exponencial e democraticamente o acesso à cultura e a difusão do conhecimento. É princípio fundamental no direito que o interesse público ou social deve prevalecer sobre o interesse particular. E, de resto, a propriedade, intelectual inclusive, “deve cumprir sua função social” (art. 5°, XXIII, da Constituição da República).

SIDNEY SIQUEIRA

terça-feira, 7 de julho de 2009

ALTERIDADE

“Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços” (art. 2º, caput, CLT).
Redação normativa que pela simples leitura deixa claro que é o empregador quem assume os riscos da atividade econômica, mas não foi o que constatei hoje. Em conversa com um representante comercial uma frase me chamou muito a atenção: “Sou remunerado por liquidez, ou seja, caso algum comerciante que eu venda não efetue o pagamento na data pactuada, meu pagamento fica suspenso até a resolução de tal situação”. Parece justo? Sem dúvida que não, nem legal, pois pela determinação legal ao empregador/empresário é vedado descontar eventuais prejuízos dos empregados, pois estes não são os responsáveis pelos riscos da atividade, princípio da alteridade. É o empregador quem assume os riscos, o custo do negócio, seus lucros e prejuízos, não pode transferi-los ao empregado. Assim sendo, o empregador não pode descontar do empregado, por exemplo, o cheque sem fundos que este vem a receber. O empregador tem responsabilidade por todos os gastos necessários ao empreendimento. O empregado recebe salário e o produto do seu trabalho é do empregador.
A única exceção onde a lei permite ao empregador descontar dos salários do empregado os danos causados por este, é quando ficar demonstrado que o trabalhador agiu com intenção, com o propósito de provocar os prejuízos. Entretanto, quando os danos não forem propositais, quando forem decorrentes de imprudência, de imperícia ou por negligência o desconto somente poderá ser efetuado se houver cláusula contratual expressa nesse sentido. Ora, se o empregador não explicitou tal hipótese em documento escrito vai arcar com o prejuízo, pois, como estabelece o parágrafo primeiro do artigo 461 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), não pode efetuar desconto algum.
Portanto, mesmo que o empregado aceite tais condições impostas pelo empregador, pois às vezes diante da necessidade algumas condições são aceitas, mesmo que não benéficas. Estas não deixam de ser ilegais pela simples anuência do empregado, pois são direitos irrenunciáveis, e numa futura reclamação trabalhista, o empregado ainda terá direito de ser ressarcido, respeitado o limite temporal para requerer, que são de: até 5 (cinco) anos após a ocorrência do fato ou até 2 (dois) anos após o término do contrato de trabalho.
SIDNEY SIQUEIRA

sábado, 4 de julho de 2009

AS EXPRESSÕES!

A notícia da decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal pela não-obrigatoriedade da exigência de diploma para jornalistas, no dia 17 de junho, até hoje repercute na sociedade, principalmente no cenário acadêmico. Os ministros entenderam que tal exigência fere a liberdade de imprenssa e contraria o direito à livre manifestação do pensamento inscrita no artigo 13 da Convenção Americana dos Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica).
Seria tal decisão a decretação do fim do curso de graduação em comunicação social com habilitação em jornalismo? Essa é a ideia principal da revolta dos estudantes, mas são preocupações desnecessárias, pois como, de maneira brilhante, explicou meu ex-professor de filosofia, o grande Adrualdo Catão, tal decisão do STF é sem sombra de dúvida, extremamente acertada, pois a capacidade de expressão é uma coisa inata dos seres humanos, porque não dizer vivos, e exigir pré-requisitos para seu exercício seria uma forma de restringir o desenvolvimento de tão importante capacidade.
Tomar atitudes como abandonar a faculdade, achar que estão jogando tempo e/ou dinheiro no lixo, fazendo graduação em jornalismo, não é uma atitude lógica, pois a intenção do STF não é desprezar a importância do curso, esta não foi alterada em nada, apenas quis o tribunal reafirmar o que já deveria ser a regra comum: as expressões são livres!
Sem falar que, qual seria a empresa profissional que contrataria um funcionário sem conhecimentos técnicos, para exercer a função de repórter, editor, redator, dentre outras? Estas exigem e sempre exigirão conhecimentos adquiridos na graduação para sua concretização, salvo pouquíssimas exceções, como no caso de ex-jogadores, pilotos, que se tornam comentaristas esportivos.
Portanto, não existem fundamentos que justifiquem tanta repercussão contrária a uma decisão tão racional e acertada, afinal, ser graduado em comunicação social com habilitação em jornalismo, continua com a mesma importância.
SIDNEY SIQUEIRA